por Tânia Tanocas, em 02.07.17
Primeira leitura para o #bookbingoleiturasaosol
Categoria: "Esquecido na estante"

Opinião:Dos 629 livros que tenho para ler (só em papel
), decidi que o livro 125 já estava à muito esquecido na estante e decidi pegar neste pequeno grande miminho. Desengane-se quem achar que este é um livro "fofinho" que fala de um velho que só lê romances de amor, esta pequena novela, é como um estalada à civilização que se intromete e destrói aquilo que deveria preservar e adorar. "António José Bolívar ocupava-se de as manter à distância, enquanto os colonos devastavam a floresta construindo a obra prima do homem civilizado: o deserto." Primeiro, achei que é bastante educativo em termos de preservação das nossas florestas (neste caso, uma das mais importantes, a Amazónia), a fauna e a flora são tão, ou mais importantes do que o progresso, as pessoas caçam o essencial para sobreviver, vivem na pacatez do seu dia a dia, a sabedoria é imensa, não compreendem os colonos que por outro lado também não compreendem o estilo de vida dos habitantes destes lugarejos, muitas das vezes, para seu belo prazer devastam o sossego destes sítios sem terem a consciência de que o fazem... António José Bolívar é um velho, que conseguiu sobreviver na floresta graças ao conhecimento que adquiriu ao longo da sua vida com os índios, vive numa pequena aldeia (El Idilio), onde duas vezes por ano o dentista Rubicundo Loachamín surge para "remediar" os pacientes das suas mazelas bucais, exactamente como o funcionário dos correios, que raramente leva correspondência para os habitantes. É por ocasião de uma dessas visitas que se desenrola a acção, o humor sarcástico do médico, dá logo a entender a antipatia que sente em relação ao poder político, a sua condescendência para com os pacientes também não é a mais saudável, mas é dos poucos que aparece para lhes auxiliar em alguma coisa... O velho António José Bolívar e o médico começaram uma ligação que se revelou bem mais importante do que qualquer valor monetário deste mundo, nesse dia algo acontece, e as consequências vão levar o velho a desfolhar o livro do seu passado e dar-nos a conhecer o seu conhecimento da floresta e amor pelos romances (só de amor). O autor dedica este livro (que foi prémio Tigre Juan) a Chico Mendes, um dos mais lídimos defensores da Amazónia, que "a muitos milhares de quilómetros e de ignomínia um bando de assassinos armados e pagos por outros criminosos mais importantes, daqueles que usam fatos de bom corte, unhas cuidadas e dizem actuar em nome do «progresso», liquidavam a vida de uma das figuras mais destacadas e consequentes do Movimento Ecologista Universal."Certamente, um autor que desejo continuar a acompanhar, pois a sua escrita é bastante audaz, com uma mensagem muito elucidativa e educativa.De salientar que este livro faz parte do plano nacional de leitura, apesar de ter alguns relatos mórbidos que podem chocar, acho que se enquadra totalmente no contexto da preservação e impulsionadora para amar os livros. "Quando havia uma passagem que lhe agradava especialmente, repeti-a muitas vezes, todas as que achasse necessárias para descobrir como a linguagem humana também podia ser bela." "O prémio também é teu, e de todos os que hão-de continuar o teu caminho, o nosso caminho colectivo em defesa deste único mundo que possuímos." 

Luis Sepúlveda nasceu em Ovalle, no Chile, em 1949. Da sua vasta obra (toda ela traduzida em Portugal), destacam-se os romances O Velho que Lia Romances de Amor e História de uma Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar. Mas Mundo do Fim do Mundo, Patagónia Express, Encontros de Amor num País em Guerra, Diário de um Killer Sentimental ou A Sombra do que Fomos (Prémio Primavera de Romance em 2009), por exemplo, conquistaram também, em todo o mundo, a admiração de milhões de leitores. Em 2016, recebeu o Prémio Eduardo Lourenço.